O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou hoje que o governo ainda não discute um plano específico para lidar com a perspectiva de faltarem recursos da ordem de R$ 10,9 bilhões para cumprir os níveis mínimos de gastos com saúde e educação no Orçamento de 2027.
Essa perspectiva consta das projeções iniciais do governo para o Orçamento de 2027 no Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) de 2026, cujos detalhes foram divulgados hoje.
— A cada etapa que for cumprida a gente vai tomando providências para acertar o Orçamento. Ainda não abrimos discussão sobre isso, estamos trabalhando nesses assuntos, tem muitos desafios como a questão dos precatórios — afirmou o ministro, na saída dos estúdios da TV Brasil no Rio, onde participou do programa “Sem Censura”, apresentado por Cissa Guimarães, referindo-se aos pagamentos de indenizações judiciais pela União, que foram represados no governo Bolsonaro.
A previsão negativa sobre as contas de 2017 decorre dos limites do arcabouço fiscal e também do pagamento de precatórios e indica que as regras fiscais atualmente em vigor precisarão passar por mudança.
Na rápida conversa com jornalistas, Haddad também afirmou que as despesas do governo com precatórios e emendas parlamentares “precisam ser conversadas” para que o país possa alcançar o equilíbrio orçamentário:
— Precisamos discutir com a sociedade e o próprio Judiciário como tratar esse tema, que ganhou tração no último governo, teve um salto muito grande no governo Bolsonaro, saiu de uma coisa em torno de R$ 50 bilhões e quase dobrou. Para um país que precisa fazer um ajuste nas contas, é um desafio grande. O volume de precatórios e emendas não existia num passado recente, tem muitas coisas que precisam ser conversadas.
No PLDO, o governo traz projeções para os próximos quatro anos: Em 2027, as despesas discricionárias (os gastos livres, como investimentos) somariam R$ 122,2 bilhões. Porém, R$ 56,5 bilhões são de reserva para o pagamento de emendas parlamentares. Sobrariam, então, R$ 65,7 bilhões. Assim, de partida, já faltam R$ 10,9 bilhões para honrar os compromissos constitucionais.
Efeito Trump
Ainda na saída da TV Brasil, no Centro do Rio, Haddad comentou a guerra tarifária iniciada pelo presidente dos EUA, Donald Trump. Disse acreditar que a postura do governo brasileiro — capitaneada pelo vice-presidente Geraldo Alckmin junto com o Itamaraty — é a “melhor possível”:
— (É) considerar um parceiro histórico que está com um governo diferente, mas que é um parceiro de séculos do Brasil. Entender que é um momento delicado da história americana e saber lidar com isso, colocando nossos pontos de vista, que são absolutamente defensáveis. Os EUA têm superávit com o Brasil. Não existe um país superavitário impor restrições de comércio a um país deficitário. Essa é a incoerência que estamos tentando fazer chegar às autoridades americanas.
IR: ‘Constrangimento moral’
Haddad também expressou otimismo em relação à tramitação do projeto de isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil no Congresso. Para ele, a iniciativa será “necessariamente” aprovada ainda neste ano para entrar em vigor em 2026.
— Acredito que ela vai passar. O projeto do PP (o relator do texto é o deputado Arthur Lira, do PP de Alagoas) de reduzir quase a zero a tributação dos super ricos é uma coisa que, na minha opinião, não deveria prosperar. Não dá para reduzir alíquota de quem não paga imposto. Vamos tentar sensibilizar o Congresso a efetivamente colocar o alíquota mínima compatível ao que o trabalhador celetista paga.
E completou:
— Para valer em 1º de janeiro, tem que ser aprovado antes. E tem que ser antes do Orçamento (de 2026), porque tem impacto orçamentário. A peça orçamentária já vai com essa previsão (em agosto). Pode ser depois (mas ainda neste ano).
Na entrevista ao Sem Censura, Haddad afirmou acreditar que o projeto não deverá enfrentar dificuldades de aprovação no Congresso. Haddad, que participa do programa Sem Censura, disse ainda que a pasta não tem “compromisso com a vaidade” e que estaria disposto a ouvir ideias para melhorar o projeto.
O ministro foi ao programa detalhar o projeto que já foi encaminhado à Câmara dos Deputados. De acordo com ele, a expectativa é que as discussões em torno da isenção se iniciem depois dos próximos feriados.
— Eu acredito que nós criamos um constrangimento moral no país com esse projeto — declarou Haddad, citando o objetivo do projeto de reformar a renda como algo que unificou os debates em torno do tema.
O ministro reforçou que a equipe que formulou a proposta está pronta para receber sugestões para melhorar, mas disse que “não se ouve hoje, nem no Congresso, alguém que suba na Tribuna para falar mal”.
— Nós não temos compromisso com o erro ou a vaidade. Dá pra melhorar? Vamos melhorar. Nós tomamos a iniciativa e estamos aqui humildemente esperando sugestões. Se der pra melhorar nós vamos melhorar. Mas nós estamos muito confiantes, até mesmo pela forma como ele foi recebido, esse projeto. Ele vai ser difícil de não aprovar — afirmou.
Projeto terá impacto de R$ 27 bi
A faixa de isenção do IR deverá gerar uma renúncia de aproximadamente R$ 27 bilhões para as receitas da União. O governo sugeriu na proposta que o valor fosse compensado por uma nova alíquota mínima a ser cobrada de quem ganha acima de R$ 600 mil por ano.
A alíquota começa em zero e vai subir gradativamente, até que quem recebe mais de R$ 1,2 milhão por ano pague, pelo menos, 10% de imposto sobre sua renda, incluindo dividendos — modelo de distribuição de lucros pelas empresas que hoje é isento para pessoa física. Para quem já paga esta alíquota, a taxa não será alterada. Apesar disso, alguns deputados já discutem fazer calibragens na alíquota cobrada.
Ao ser questionado por que a taxa aos apelidados de “super-ricos” se limitou a 10%, Haddad respondeu que não gostaria que o projeto tivesse objetivo de arrecadação, o que, na sua visão, poderia prejudicar a aprovação da medida.
Segundo o ministro, a isenção beneficiará cerca de 10 milhões de brasileiros, enquanto 141 mil pagarão a compensação. Além disso, 5 milhões de indivíduos que ganham de R$ 5 mil a R$ 7 mil, terão um desconto parcial. Ao defender o projeto, Haddad disse que a medida funcionará como uma espécie de “décimo-quarto salário” para aqueles que estão dentro da faixa.
— Esse projeto tem um único fundamento: buscar justiça social. Nós queremos buscar uma coisa que esse país demora para conquistar.