Num ciclo de quatro anos, é possível começar e terminar uma faculdade; é possível, também, recuperar um negócio bilionário em descrédito. É o que a Cogna, maior empresa de educação do país, tenta mostrar com os resultados financeiros do quarto trimestre de 2024, divulgados nesta quarta-feira, 12.
A empresa, dona de marcas como Anhanguera e Red Balloon, anunciou ter atingido o guidance divulgado ao mercado no fim de 2020. O Ebitda (resultado antes de impostos e amortizações) chegou a R$ 2,174 bilhões e a geração de caixa operacional bateu R$ 1,05 bilhão.
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Eram os dois principais objetivos anunciados num momento de grandes dúvidas sobre a sustentabilidade da Cogna e sobre o futuro do mercado de educação no Brasil. O ano de 2020 marcou a formatura da última leva de alunos que utilizaram o Fies, o financiamento estudantil do governo federal. O cenário ainda combinava pandemia com o que seria, ao longo dos anos seguintes, um ciclo de aumento da taxa de juros.
“Era a tempestade perfeita”, diz Roberto Valério, CEO da Cogna. “O setor de educação não tinha nenhuma nova alavanca de crescimento. Mas nós sabíamos da potencialidade. Precisávamos mostrar que tínhamos uma história pela frente”.
De 2020 para 2024, o Ebitda da empresa passou de R$ 690 milhões (com margem de 11,7%) para os R$ 2,174 bilhões anunciados (margem de 33,9%). A alavancagem caiu de 3,2 vezes a geração de caixa para 1,35 vez. Em 2020, a Cogna lucrou R$ 242 milhões, antes de enfrentar quatro anos de prejuízo, até anunciar um novo lucro de R$ 880 milhões em 2024. Com isso, a empresa vai voltar a distribuir dividendos. A receita líquida cresceu 8,9%, chegando a R$ 6,422 bilhões.
“O quarto trimestre foi excelente, com nossas três unidades de negócio crescendo [ensino superior, sistemas de ensino e editora]”, diz Valério. “Mas o mais relevante é mostrar que esse trimestre fecha uma jornada de quatro anos em que tivemos coragem de reduzir receita para ganhar qualidade”.
Neste processo, explica o executivo, a Cogna deixou de vez de ser uma empresa focada em escala, sobretudo um público de Classe C. Hoje, tem uma oferta de produtos para alunos “dos 2 aos 100 anos”, que incluem de cursos de Educação a Distância (EAD) para as classes C/D até material didático para escolas para a Classe A. “Tivemos coragem de reduzir receita para ganhar qualidade”, diz.
Nos dois primeiros anos deste ciclo de ajuste, explica o executivo, a Cogna fechou 35% dos campi e cortou o programa de financiamento que custeava parte das mensalidades de 15% dos alunos presenciais. Mais de 4 mil funcionários foram demitidos. A receita trimestral chegou a cair 19%.
O passo seguinte foi voltar a crescer de forma mais eficiente. A empresa ampliou as ferramentas de marketing digital e conseguiu cortar pela metade o custo de atração de novos alunos à distância. Ampliou a oferta presencial de cursos mais caros, como odontologia, agronomia e medicina. Passou a oferecer materiais didáticos em novas disciplinas complementares, como inglês e robótica, hoje seus principais produtos nesta frente. O percentual de cursos com avaliação 5 no Ministério da Educação passou de 13% em 2022 para 25% em 2024.
A partir de 2025, a Cogna planeja consolidar sua imagem de uma plataforma de serviços de educação, oferecendo sistemas e montando projetos para empresas, para governos e até para concorrentes.Uma estratégia é mostrar que o investimento recente em inteligência artificial permitiu à empresa oferecer um aprendizado personalizado, que entende as demandas de cada aluno e oferece automaticamente soluções customizadas. Se um aluno de nível superior não sabe algum conceito do primeiro ano do ensino médio, por exemplo, o sistema automaticamente exibe material de reforço, sem escancarar que o estudante vai precisar fazer uma disciplina com adolescentes de 14 anos.
Fusões e aquisições podem voltar ao radar. Desde 2017, a Cogna estuda uma união à Yduqs, sua principal concorrente, num vaivém que teve o capítulo mais recente em setembro de 2024. Valério afirma que não há negociações em andamento, mas não descarta reavaliar fusões e aquisições no futuro. No momento, com as taxas de juros elevadas e a empresa valendo apenas R$ 3 bilhões na bolsa, o plano é seguir com as recompras.
Para além de todas as ações de curto e médio prazo, um desafio maior é fazer com que os investidores voltem a olhar com ambição para o mercado de educação superior. Durante boa parte da década de 2010, as gigantes de educação eram queridinhas da bolsa, turbinadas pelo dinheiro fácil do Fies. O trabalho dos últimos quatro anos é para mostrar que a Cogna tem um projeto de longo prazo e que merece voltar a ser olhada.
“Hoje geramos quatro vezes mais caixa do que em 2019, quando nossa ação valia R$ 20 [hoje está na casa de R$ 1,70]”, diz Valério.
“Quando me perguntam o que fizemos nos últimos trimestres para voltar a crescer, respondo que seguimos a mesma estratégia definida em 2020”, diz o CEO. “Vocês é que não estavam olhando”.